segunda-feira, 20 de agosto de 2012

VOTO BOM É VOTO LAICO




Quem determina se Deus é Senhor é o povo, não seus governantes.
Lembro-me dos tempos da minha infância eclesiástica. Criado na igreja desde tenra idade, como se diz, era filho de diácono batista. Ou seja, era dos últimos a sair da igreja, isso quando não fechava o templo. Naquela época, cansei de ouvir dizerem na igreja que determinadas atividades eram inadequadas para um verdadeiro cristão. Advogado, por exemplo. Onde já se viu um crente defender um criminoso, pecador? Outra atividade deplorável era a de baterista. Aquele barulho profano não podia vir do Senhor! E político, então? Já imaginou uma alma lavada e remida no sangue de Cristo se metendo naquela roda da escarnecedores, participando daquelas negociatas? 

Com o tempo, a bateria ganhou seu espaço nos altares das igrejas e os advogados viraram até presbíteros. Mas foi na área política que a coisa mudou radicalmente. Se, antes, a atuação política era desestimulada no rebanho e um crente ser vereador ou deputado era visto como um sacrilégio, agora já temos até bancada evangélica. A cada eleição, pastores candidatos pululam Brasil afora.

Até aí, nada demais; cada um usa a plataforma que possui. Quem é radialista, por exemplo, apela aos votos dos ouvintes; sindicalistas recorrem ao pleito dos operários; produtores rurais buscam apoio de colegas agricultores. Portanto, quem vem da Igreja tem mais é que conseguir votos na Igreja e defender seus interesses. 

Isso quer dizer então que cristão deve votar em cristão, crente em crente, evangélico em evangélico? Aí minha resposta é um esplendoroso não. Explico. Quando precisamos de um cardiologista, recorremos ao melhor especialista que podemos pagar ou vamos a um médico cristão? Quando o carro quebra, procuramos um bom mecânico ou simplesmente um profissional que se apresente como crente? E se formos comprar um bolo, nossa preferência será pelo mais saboroso ou optaremos por aquele feito por uma irmãzinha na fé, ainda que não agrade tanto ao paladar? E as obras? Confiamos nossos prédios a um engenheiro competente ou damos preferência ao evangélico, simplesmente porque é evangélico?

Ainda que muitos de nós favoreçamos membros de nossa comunidade eclesiástica, só o fazemos porque acreditamos e confiamos nos profissionais em questão. Em primeiro lugar deve vir a capacidade do indivíduo para realizar a tarefa a que se propõe, e depois sua opção religiosa. Por isso, ao votar, todo cristão (e cidadão) tem a obrigação perante a sociedade de tomar a mesma atitude e escolher quem acredita ser o melhor candidato o que não necessariamente inclui aqueles que professam a mesma fé ou pertencem a determinada denominação. 

Há cristãos na política que dão um grande testemunho e atuam visando ao bem estar da sociedade. Da mesma forma, há pessoas de outros credos extremamente honestas e fazendo um ótimo trabalho parlamentar ou governamental. E há políticos pilantras de todas as crenças, ou de crença nenhuma, que agem só visando aos próprios interesses. Ou seja, religião nenhuma é garantia de caráter ou idoneidade.

Como cristãos, devemos amar nosso próximo como a nós mesmos – o que também significa votar pelo outro, votar pela sociedade. Devemos, portanto, escolher o melhor candidato não apenas para nós mesmos, mas para todo o grupo social ao qual pertencemos. Esta mentalidade de voto, que é absolutamente cristã, é muito mais importante que a religião do candidato. Mas e o versículo que diz “Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor”, em Salmos 33.12? Para começar, Deus ser Senhor é diferente de bispo ser presidente, pastor ser senador e evangélico ser deputado. A religião professada pelos políticos não garante a senhoria divina.

Quem garante que Deus é Senhor é toda a nação, toda a sociedade. Um país com um presidente cristão e uma população descrente não terá Deus como Senhor. E um estado com uma população cristã poderá proclamar Deus como Senhor, ainda que seus governantes não professem tal fé. Quem determina se Deus é o Senhor é o povo, não seus governantes. Trata-se da mais pura democracia divina.

Quer dizer então que não voto em cristão? Nada poderia ser mais falso. Nesta próxima eleição presidencial, por exemplo, estou propenso a votar em uma candidata cristã – até porque os outros dois concorrentes me desagradam, um pelo partido e outro, pelo caráter. Mas vou votar nela porque é cristã? Jamais. É porque acredito que ela é a melhor candidata para o país, para mim e, mais importante, para meu próximo. E ainda votaria mesmo se ela declarasse que não acredita em Deus...



Cristianismo hoje

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