Sylvio Back já fez o documentário 'O Universo Graciliano', espécie de preparação para a adaptação da obra ficcional
O diálogo com as letras está sempre presente na carreira de Sylvio,
com atestam sua cinebiografia poética Cruz e Sousa - o Poeta do
Desterro, e também com a versão do suicídio em Petrópolis do escritor
austríaco Stefan Zweig, na produção internacional Lost Zweig, baseada no
livro de Alberto Dines, Morte no Paraíso. A vocação de diálogo com a
literatura continua agora na adaptação do romance do escritor alagoano
Graciliano Ramos, Angústia, prevista para o início do ano que vem.
Filme vai ao encalço de rastros de Graciliano, que viveu de 1892 a 1953 |
Ganhando musculatura para o desafio, Sylvio já filmou o
documentário O Universo Graciliano, com locações em Maceió e Rio de
Janeiro, uma espécie de preparação para a abordagem da ficção do autor
alagoano. "O filme vai ao encalço de rastros, sombras e escombros
imemoriais em torno e sobre o genial Graciliano, que viveu de 1892 a
1953", conta. Esse documentário prospectivo é definido pelo cineasta
como espécie de "ensaio geral" com vistas à abordagem de Angústia,
romance jamais filmado de Graciliano. O difícil trabalho de passagem da
prosa do escritor alagoano para as telas terá início no final do ano.
Sabe que, além das dificuldades intrínsecas da versão para a tela
terá de enfrentar comparações. "Dos livros ‘clássicos’ de Graciliano,
Angústia é o único ainda não filmado; os demais, Vidas Secas e Memórias
do Cárcere, ambos de Nelson Pereira dos Santos, e São Bernardo, de Leon
Hirszman, são hoje obras seminais do cinema brasileiro. Por aí pode-se
aquilatar a minha responsabilidade", diz. De fato, Vidas Secas é tido
como uma das obras clássicas do Cinema Novo, assim como São Bernardo.
Memórias do Cárcere foi o filme considerado como símbolo do processo de
abertura política que se realizava no País, após 20 anos de ditadura.
Angústia é também um grande desafio. É, talvez, o mais "existencial" e
atormentado dos romances de Graciliano. Seu personagem, Luís da Silva,
sem deixar de ser brasileiríssimo e nordestino, tem um toque
dostoievskiano. A narrativa flutua entre a vida presente do funcionário
Luís e recordações da sua vida pregressa, da morte do pai e do amor
ambíguo por Marina. O engraçado é que, a certa altura da narrativa, o
personagem não deixa de destilar sua raiva contra uma invenção moderna
que, de acordo com ele, seria contra a moral e os bons costumes - o
cinema.
O fato é que as dificuldades são muitas. Narrado em primeira pessoa,
com linha temporal fragmentada e uma densidade psicológica difícil de
encontrar em personagens contemporâneos, do cinema ou da literatura,
Angústia é uma das obras-primas das letras brasileiras. Para vertê-lo
para o cinema, é preciso, primeiro, compreendê-lo de forma profunda. Foi
o caminho escolhido por Back. "As pesquisas para filmar O Universo
Graciliano nasceram à época da escritura do roteiro de A Angústia (é o
título que terá a produção) quando me dei conta que até então ninguém
havia realizado um filme sobre a vida-obra-e-morte de Graciliano Ramos",
diz.
Aprofundando-se no ambiente em que viveu Graciliano Ramos, o cineasta
acredita ter adquirido uma visão abrangente sobre o personagem e sua
obra.
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